Se há um programa que personifica a intensidade e a imprevisibilidade do college football, ele atende por Auburn Tigers. Localizado em Auburn, Alabama, a universidade abriga uma das torcidas mais apaixonadas, envolvidas e, por vezes, impacientes da NCAA.
O futebol ali não é apenas uma paixão, é um modo de vida. Um compromisso que molda rotinas, define semanas e, muitas vezes, transforma derrotas e vitórias em eventos quase espirituais.
Onde o college football é vivido até o último segundo
Viver o Auburn Tigers é abraçar o caos com orgulho. São temporadas brilhantes seguidas por colapsos inesperados, vitórias históricas sobre rivais poderosos e derrotas inexplicáveis contra adversários menores. Mas, acima de tudo, é um programa com tradição, história e uma base de fãs que jamais recua.
Jordan-Hare Stadium: um palco de milagres
Com capacidade para mais de 87 mil pessoas, o Jordan-Hare Stadium é um dos ambientes mais eletrizantes do futebol universitário. Nos dias de jogo, a cidade de Auburn se transforma, é como se todo o Alabama girasse em torno daquele campo. E, de certa forma, gira mesmo.
O estádio é famoso por momentos que desafiaram a lógica, jogadas improváveis, retornos inacreditáveis, reviravoltas nos segundos finais. Nenhum torcedor de college football esquece o chamado “Kick Six” de 2013, uma tentativa de field goal longa por Alabama nos segundos finais foi retornada por Auburn por 109 jardas para o touchdown da vitória. O momento, histórico, virou símbolo da imprevisibilidade e da emoção crua que define o programa.
Ali, os milagres acontecem. E a torcida acredita até o último snap, mesmo quando tudo parece perdido.
O Iron Bowl: a guerra civil do Alabama
É impossível falar de Auburn sem falar do Iron Bowl, a rivalidade anual contra o Alabama Crimson Tide. Mais do que um jogo, é uma guerra cultural, regional, histórica. O Alabama pode ter sido dominante na maior parte das últimas décadas, mas Auburn tem seu próprio histórico de triunfos e quando vence, vence com barulho.
O Iron Bowl divide famílias, cidades, amizades. A intensidade do confronto é tal que treinadores são contratados (ou demitidos) com base em seu desempenho contra o maior rival. Em Auburn, vencer Alabama pode salvar uma temporada. Perder pode arruiná-la, mesmo que venha acompanhada de outras vitórias.
Em um estado onde não há times profissionais, essa rivalidade é o Super Bowl local, com um nível de envolvimento emocional que só o Sul profundo dos EUA é capaz de produzir.
Glórias recentes e um passado vencedor
Auburn não é apenas tradição e rivalidade, é também sucesso esportivo. O programa já conquistou dois títulos nacionais reconhecidos oficialmente, sendo o mais recente em 2010, sob o comando do técnico Gene Chizik e com o quarterback Cam Newton em uma das temporadas individuais mais dominantes da história do college football.
Newton venceu o Heisman Trophy, foi a peça central de um ataque imparável e levou Auburn à glória máxima com um título nacional sobre Oregon em um jogo que ainda vive na memória da torcida.
Antes disso, nos anos 1980, o lendário Bo Jackson colocou Auburn no mapa esportivo e se tornou um ícone cultural, vencendo o Heisman em 1985. Jackson continua sendo reverenciado não apenas como o maior atleta da história da universidade, mas como um dos maiores esportistas da história dos Estados Unidos.
O programa venceu a SEC Championship três vezes nos últimos 20 anos (2004, 2010 e 2013) e disputou o título nacional também em 2013, perdendo nos segundos finais para Florida State. Mesmo em meio a altos e baixos, Auburn sempre está a um momento mágico de se tornar assunto nacional.
A montanha-russa recente e a chegada de Hugh Freeze
Desde o vice-campeonato de 2013, Auburn viveu anos de instabilidade. Treinadores como Gus Malzahn e Bryan Harsin tiveram lampejos de sucesso, mas nenhum conseguiu sustentar consistência suficiente para manter o time no topo da SEC.
Em 2022, a universidade apostou em Hugh Freeze, ex-técnico de Ole Miss e Liberty. Conhecido por sua habilidade ofensiva e mentalidade ousada, Freeze chegou a Auburn com uma missão clara: restaurar a competitividade do programa e colocar os Tigers de volta à briga contra as potências da conferência.
Sua primeira temporada foi marcada por transição, ajustes e uma base promissora. O recrutamento se intensificou, e a expectativa em Auburn voltou a subir. O retorno da energia no Jordan-Hare é um sinal claro de que a torcida acredita, mais uma vez, que dias de glória podem estar no horizonte.
Cultura, torcida e um programa sem meio-termo
Auburn vive intensamente. Não há espaço para o morno. O programa alterna entre temporadas mágicas e anos frustrantes, mas jamais passa despercebido. O lema “It just means more”, frequentemente associado à SEC, poderia facilmente ter sido cunhado especificamente para a Auburn University.
A cultura local é profundamente enraizada no futebol americano. Os tailgates começam cedo, as tradições são mantidas com orgulho (como a celebração com papel higiênico nas árvores de Toomer’s Corner após grandes vitórias), e os jogadores que passam por ali carregam a responsabilidade de uma comunidade que exige, sofre, comemora, mas nunca abandona.
O que esperar dos Tigers na nova era da SEC
Com a SEC cada vez mais competitiva, a missão de Auburn é clara: construir consistência. A estrutura existe. A torcida está presente. O estádio pulsa. O que falta é estabilidade e isso, Hugh Freeze promete entregar.
O calendário brutal da conferência exige profundidade, talento e sangue frio. Auburn não terá espaço para crescimento lento, mas se conseguir encaixar bons ciclos de recrutamento e desenvolver sua identidade ofensiva com criatividade e solidez defensiva, pode surpreender, como tantas vezes já fez.
Afinal, se tem um programa que sabe como virar o jogo em uma jogada, ou mudar o rumo de uma temporada em um único sábado de novembro, esse programa é Auburn.
No próximo capítulo da série “Conheça os Programas”, viajaremos até Baton Rouge para conhecer os Ole Miss Rebels, uma universidade que carrega tradição, uma torcida elegante e barulhenta, e uma das mentes ofensivas mais ousadas do país à frente do programa.